Falá desses cinco dedo
qui num têm valô nem nada,
isso é, num têm valô
pruque é mão calejada
do negro que já passô.
E nessa sociedade
adonde impera a mardade
e a farsidade chegô
só tem valô quem tem nome
quem tem um curso de fome
vale é nada sim sinhô.
Falá dessas mão cansada
qui num tem ané nem nada
ané de grau de dotô,
inté crime deve sê,
falá dessas mão cansada
que nem se ajeita escrevê.
Mas essas mão, seu dotô,
que as vez pede uma esmola
pra aos tranco eu podê vivê,
já tocô munta sanfona
pra gente “grande” dançá,
já revorveu munta terra
pras coisa boa prantá,
pro seu dotô na cidade
de ané no dedo comprá.
Já seu dotô, já fez rede
pro sinhô se balançá,
foro essas mão calejada
que munta cruz fez na estrada
pra sepurtura marcá.
Foro essas mão, seu dotô
que já coieu munta frô
pru seu salão enfeitá.
Foro essas mão sem valia,
essas mão sem sevrentia
que hoje pra nada presta.
Que o sinhô diz que num presta
pruque tá véia e cansada
pruque se estende a uma esmola.
Foro essas mão seu dotô,
que fez casa pra vancê,
que pra vancê fez escola.
Foro essas mão, seu dotô,
essas mão abrutaiada
que inté já coieu uma rosa
pra Sabina dedicá,
Pois essas mão calejada,
essas mão sacrificada
já teve quem carinhá
essas mão selô cavalo
pra coroné passeá.
Foro essas mão, seu dotô,
que prantô munto café,
que limpô, coieu, torrô,
e hoje pra nada presta
Preto véio vale nada
pois o seu tempo passô,
e preto véio cansado
num tem patrão nem valô.
Mas essas mão, seu dotô,
munto embora já cansada
cheia de calo da enxada
que o tempo nunca desfez,
é mão limpa de vredade,
num é dessas mão covarde
que só armada é valente.
É mão de cabra decente.
Num é dessas mão bunita
mas que se esquece no jogo.
Não, seu dotô, essas mão
nunca teve essas noção
de cheque farsificá.
É, seu dotô,
essas mão
têm o direito e a razão
de à noite a Deus suplicá.
Pruque é bom, seu dotô,
sem nome,
o cabra caí de fome
sem um pedaço de pão.
Pode inté morrê na estrada,
porém morrê como home,
com as mão feia, calejada
com as mão cansada da vida,
com as mão vazia, sem nada
esmolejando um tostão.
Mas dotô,
com Deus no peito e na alma
e um pouco de Deus nas mão.