segunda-feira, 28 de maio de 2018

NA BOCA DO CAIXA



Na boca do caixa
o dinheiro não deu.
Retoma arroz
volta feijão
que rei sou eu?
O salário sequer
mata-me a fome.
Na carteira de trabalho
tem meu nome.
O açúcar eu levo
pra adoçar a vida.
O sal retoma,
temperar o que?
A vela eu levo
pra ter luz acesa.
O pão preciso
pra ficar na mesa
pra por na gente
a sensação de ter.
Levo o fubá
que é pra mexer
com o pranto.
É um tanto amargo
mas careço tanto
mingau qualquer
para sobreviver.
Volta a manteiga
da dor de barriga,
é tanto luxo
volta o leite em pó.
Eu tenho um nó
que me sufoca o peito
e o nó não deixa
eu meditar direito
porque é que o pobre
é sofrimento só.
Levo o biscoito
que o menino espera
e quem espera
deve conquistar,
 se não machuca
aqui por dentro,
tudo tal qual comigo
que não mais me iludo
levo biscoito
que é pra sustentar.
Levo o sabão
que é pra lavar-me a alma
não tira nódoas
da desesperança
porém quem sabe
faz revigorar.
A gente vive
acalentando a calma
a fé malvada
que jamais se cansa
de crer que o amargo
Vai se adocicar.
Levo a cachaça
pra tomar um porre
pra ver se acaso
essa tristeza morre
e um riso bêbado
eu possa inventar.
Volta a cachaça
que a cachaça dobra
e essa tristeza
que me dói de sobra
se eu ver dobrado
não vou suportar.
Preocupa não, seu moço
o resto eu levo,
meu fardo é grande
cabe quantidade.
levo tristeza,
levo uma vontade.
Melancolia tem de qualidade,
eu só lamento
não levar nas compras
sequer cem gramas de felicidade.


Um comentário:

  1. Tudo que o poeta João Prado escreve é bonito, tem sentido, é real, é verdadeiro. Ele expressa o sentimento do homem pobre brasileiro. Amooooo!

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